quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Oscar 2014: Jasmine, Dr Stone e Alabama (não, não são princesas da Disney)



Estes foram os três primeiros filmes indicados ao Oscar 2014 aos quais assisti. A ideia era escrever um post para cada um, mas na hora cotidiana mais propícia ao insight - o banho nosso de cada dia -, percebi alguns laços que poderiam render alguma reflexão.

De cara, os filmes têm mulheres no centro da trama, personagens extremamente distintas entre elas. Dr. Ryan Stone, de "Gravidade", personagem vivida a duras penas (ainda que impecavelmente) por Sandra Bullock, é uma engenheira médica em sua primeira missão espacial. Séria, racional, ela de início mostra-se sensível apenas às desagradáveis sensações de enjoo e mal-estar causadas pela ausência de gravidade. Aos poucos, se vê dependendo da ajuda de um astronauta experiente, do qual recebe as coordenadas para sobreviver a um acidente do qual ela é a única sobrevivente. Para isso, precisa chegar ao extremo, identificando o que é imprescindível para se manter viva, encontrando suas verdades e desapegando-se de todo o resto. 

Jasmine, brilhantemente encarnada por Cate Blanchett, de "Blue Jasmine", é uma tipica personagem neurótica de Woody Allen em diversos aspectos. Racionalizações, ansiedade frente às fantasias sobre como seu eu se apresenta ao outro, angustia e um enorme impacto emocional causado por qualquer abalo de mínimo grau são constantes. Porém, ela ainda tem que lidar, com pouco sucesso, com um sentimento dos mais pesados, aquele que sussurra no ouvido palavras de julgamento e punição - a culpa.

Alabama, ou antes Elise, visceralmente desenhada por Veerle Baetens em "Alabama Monroe", é uma tatuadora, ela mesma cheia de (lindas) tatuagens, de pele grossa e voz doce. Em um certo momento, somos levados a descobrir que vários desenhos de seu corpo eram antes declarações a amores antigos, que ela apagou (jogando tinta e transformando em outra coisa) quando terminaram. E é assim que Alabama tenta fazer: apagar, mudar, transformar suas perdas. Mas a epiderme é superficial demais, e transformar sem profundidade não apaga marcas que alcançam outros tecidos, órgãos, código genético, como duramente constatam ela e seu par, o (charmoso, mas não unânime) tocador de banjo, homem da ciência, ateu Didier.

As perdas que a vida pautou a Ryan, Jasmine e Alabama são irreparáveis. Jamais deixarão de gritar em suas memórias, em sua saúde, em suas relações. Além de vitimas da traição da vida, como Alabama diz, elas são também exiladas em seu sofrimento. São pessoas que, em um certo momento, se veem sem um porto seguro, emocional ou geográfico. Entretanto, a partir deste ponto, onde os destinos das três se encontram, há a divergência; cada uma utilizará os recursos que lhe cabem para retomar a direção da própria vida. No rolar dos dados, as faces disponíveis: suportar, não suportar ou superar.

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

O mito da (bat)caverna




É um pouco estranho realizar o sonho de tirar novas férias em um intervalo de 3 meses, mas nada como a adaptação!
Hoje meu dia de férias incluiu uma boa caminhada ao sol, sorvete Hägen-Dazs e ajudar minha prima Luiza em um trabalho de escola. Matéria: Filosofia. Tema: analisar a alegoria da caverna platônica com uma obra cultural. Obra escolhida pela Luiza: The Dark Knight Rises. Abaixo, o que virou essa história...


"There is a prison in a more ancient part of the world. A pit where men are thrown to suffer and die. But sometimes a man rises from the darkness. Sometimes the pit sends something back."
(Há uma prisão numa parte mais antiga do mundo. Um poço onde os homens são jogados para sofrer e morrer. Mas as vezes um homem emerge das trevas. As vezes, o poço manda algo de volta.)

Em "Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge", podemos associar a alegoria de Platão em níveis, do individual ao coletivo, constatando que a realidade é objetiva e subjetiva - ou seja, é da realidade apresentada por um outro (ou por um acontecimento) que podemos encarar e compreender a nossa própria realidade, moldada pelo que somos até aquele ponto. 

Em nível individual, é óbvio pensar na transformação pela qual a personagem Bruce Wayne/ Batman passa ao longo da trilogia. 

O filme começa com Wayne voluntariamente retirado da sociedade, após perder a esposa e assumir falsamente a culpa pela morte de Harvey Dent. Ficamos sabendo que, num passado distante, ele integrava um grupo chamado Liga das Sombras, cujo objetivo era treinar e capacitar as pessoas nas artes de luta e estratégia de combate, com o propósito final de "limpar Gotham City da escória". Quando Wayne descobre que isso envolve eliminar os cidadãos da cidade a um preço muito caro, ele decide abandonar o grupo (não sem antes incendiar o local de treinamento). O problema é que há um mercenário chamado Bane, também treinado pela Liga, disposto a continuar com os objetivos de destruir a Gotham cheia de vícios.

Vários personagens aparecem para Wayne como a "realidade" e tentam-no fazer encará-la. O policial Robin John Blake lhe conta que o orfanato não é financiado pelo grupo financeiro de sua família há dois anos, o detetive Gordon pede que ele ajude a cidade a livrar do mal que eles mesmo causaram. O ápice ocorre quando Alfred lhe pede que fique fora da luta contra Bane e tente viver sua vida, pois a esposa falecida que ele tanto honrava em luto e solidão estava pensando em deixá-lo antes de morrer; ao invés de convencê-lo, isso acaba aumentando o desejo de Wayne salvar a cidade novamente.

Além dele, podemos pensar outras personagens que "saem da caverna", como a Mulher-Gato, que percebe que sua realidade era maior do que fazer pequenos golpes e julgar quase como "direito" roubar os mais ricos. Podemos também pensar que o núcleo dos vilões da história é o único que não passa por uma transformação, não sai de sua "caverna": e é por isso que ficam presos em suas ideias, jogando com as palavras, sombrias.

No nível coletivo, é possível pensar que a própria sociedade de Gotham passa por uma transformação (ou pelo menos começa a se transformar). Afinal, como o vilão Bane comenta, "Eu sou um mal necessário"; não dá para dizer que os cidadãos são totalmente inocentes (como Ms. Tate comenta, "Inocente é uma palavra muito forte para falar de Gotham"). Não podemos negar que a violência e a destruição que são defendidas pelos vilões do filme podem, de fato, ser consequência do modo de viver daquela sociedade, ainda que não seja a justificativa para uma destruição. De qualquer maneira, vemos alguns fragmentos de revolta e de tentativa de lutar contra aqueles que tentam dominar e acabar com toda a cidade, e também vemos alguns cidadãos que fecham as portas de casa e não querem tentar fazer nada. A mudança pode ser através da luta, ou através de uma reflexão que venha apenas com o tempo.

E é aí que a análise individual se encontra com a análise do coletivo: podemos pensar que Bruce Wayne "mata" o Batman (Cavaleiro das Trevas, ou seja, da escuridão, das sombras) porque ele já não pode mais viver nas sombras. Ele viu que a realidade é maior, e talvez ele tenha percebido que Gotham precisa viver com as próprias pernas. E ele também.

O que devemos saber é que, uma vez que saímos da caverna, não há como voltar para ela. Pelo menos não voltamos como éramos antes, e sim transformados. Nosso olhar é outro, pois já vimos a realidade como ela é. E essa realidade, mesmo ela, não é imutável; ela se amplia conforme podemos conhecê-la e transformá-la. E, para sair da caverna, não podemos ser como as pessoas que se limitavam a rir ou não acreditar no homem do mito, que deixou de ver as sombras. Temos que abandonar os medos e ter a coragem de olhar por nós mesmos.

quarta-feira, 14 de agosto de 2013

O pedaço da vida que são as férias

(menino ouvindo áudio sobre obra de Miró, no Museum of Modern Arts, NYC, em ago/13)

Férias são sempre boas, mas não são boas sempre - para uns, ela traz um certo sentimento de vazio pelo ócio excessivo, para outros traz uns quilos a mais. Já ouvi gente que caiu na cama, doente, no primeiro dia sem ter que bater o ponto (o que não é à toa nem coincidência, na maioria das vezes, vamos combinar!). E, claro, tem férias que só são ruins no momento em que acabam.

Sou daquelas pessoas que fazem de tudo para aproveitar bem as férias, seja viajando (o que me dá uma certa preguiça de resolver sozinha, mas para isso conto com uma família enorme e em especial uma prima-irmã sempre disposta a viajar e resolver todos os procedimentos burocráticos com mais facilidade do que preparar comida congelada - no caso dela, quero dizer isso literalmente!), seja aproveitando os dias em casa, fora da loucura do trabalho (o que, digamos, no meu caso também é literal, sem conotações pejorativas do termo "loucura"). 

Este ano, passei metade das férias em viagem. Chego, assim, a uma outra modalidade de "cons" deste período de descanso: o o stress natural das viagens de férias. Nem que esse stress seja vivido naturalmente e com muito bom humor, é inegável que ele existe. Não é só pelo hotel que se mostrou uma decepção, ou pela simpatia de guerra dos taxistas, ou pela discordâncias entre as partes sobre qual programa fazer; há o stress do corpo pelas mudanças na rotina, o fuso horário, o jet lag.

Mas "sair de cena" é importante. Quando há a possibilidade de viajar, é melhor ainda, pois você poderá trazer uma nova experiência cultural -  e experiência nunca é desperdício. Se não dá para viajar, também pode ser proveitoso imersar-se em uma experiência particular que seja de seu agrado, como arriscar-se a uma nova modalidade de lazer, o que pode ser em níveis distintos de novidade. Por exemplo, gosta de filmes e quer assistir a filmes novos. Que tal conhecer um gênero que não costuma ser sua primeira escolha - um documentário, ou um filme de terror? Em outro nível de novidade, vale até rever um filme bacana e prestar atenção a algo que nunca foi seu foco de atenção, como os efeitos sonoros, ou o figurino.

Férias não representam um hiato da vida, e sim do aspecto "produtivo" da vida, seja do trabalho, seja dos estudos. Esperar as férias não é esperar que as regras da vida, que sempre impera, às vezes frustra e nunca é perfeita, sejam revogadas neste intervalo. Assim, não será necessariamente um mar de rosas, a não ser que suas férias sejam pequenas o suficiente para caber um mar de rosas. 

Mas se a alma for maior ou se assim o quiser, vale a pena ir além do convencional - mergulhe!

quinta-feira, 1 de agosto de 2013

Samba do só



O que foi essa atitude vil?
Eu nem sei o que dizer, viu
Só posso sentir decepção
Você decepou meu coração

Se não pode dizer por quê
Garanta apenas que isso
Nunca mais vai acontecer, porque
Minha certeza sempre foi na bondade
Quero crer num amor de verdade
E o que tenho no peito dá pra dar e vender

O que foi essa atitude vil?
Eu nem sei o que dizer, viu
Só posso sentir decepção
Você decepou meu coração

Sei que devo desejar sorte
Que sua vida corra como você quer
Mas sei que nela já não cabe uma mulher
Não cabe mais ninguém além de ti

Eu sei
Que o perdão é uma virtude, como queira
Mas fico triste quando fico de bobeira
Sozinha a minha mágoa há de sumir

O que foi essa atitude vil?
Eu nem sei o que dizer, viu
Só posso sentir decepção
Você decepou meu coração